quarta-feira, 17 de março de 2010

eNTREVISTA: sUPERGUIDIS


O trecho de qual canção definiria o momento dos Superguidis no terceiro disco?

Andrio: Talvez "I'm still living the dream we had, for me it's not over" (eu ainda estou vivendo o sonho que tivemos, para mim não acabou), refrão de Big Time, do álbum Broken Arrow, Neil Young. Tá, vai a música toda! Sentimos que é o grande momento na carreira da banda.

Lucas: Pô, eu não conseguiria achar uma frase melhor...

A banda mantém rara coerência como "operários" na construção do novo mercado da música independente. Qual segredo?

Andrio: Estamos trilhando um caminho, é verdade. Para nós, muito mais coerente do que esses pulos no abismo que muita galera dá. O problema todo é a afobação e a busca pelo "sucesso", nem que isso custe a integridade artística. Sobretudo falando de um "mainstream" tão imbecil quanto este nosso. Queremos o reconhecimento, sem dúvida, mas que ele venha com a consolidação de um trabalho autoral e de conteúdo.

Lucas: Nunca fomos deslumbrados com essa história de "ser banda grande". O foco sempre foi a música e o reconhecimento como consequência. Eu tô muito feliz com a situação que a nossa banda vive hoje, quer dizer, a gente andou boa parte do Brasil tocando e temos um puta reconhecimento pelo que fazemos. Sem contar o fato que fazer música vai ficando cada mais divertido à medida que a gente vai aprendendo umas coisas e se permite experimentar.

O Lucas disse que "fazemos música para quem quer nos ouvir". Lógica inversa, pois a maioria compõe para os outros ouvirem.

Lucas: O lance é que a música tem que vir em primeiro lugar sempre! É para isso que se deve ter uma banda, ao menos para mim. O que eu quis dizer foi que eu não vou tentar "adivinhar" o que as pessoas querem ouvir ou tentar me "adaptar" a um certo público.. Nos interessa muito mais cativar quem quer nos entender do que tentar convencer as pessoas a nos aceitarem. Pode soar meio prepotente mas, na verdade, é o contrário. Eu tenho uma puta bronca com essa grande indústria fonográfica que fabrica ídolos e os empurra goela abaixo de um público tratado como idiota, incapaz de ter opinião própria. Dou um baita valor aos caras que vão atrás dos nossos discos no soulseek ou em qualquer lugar da internet.

Sobre o que fala, exatamente, a canção "As camisetas"?

Lucas: "As camisetas" é sobre um pé na bunda que aconteceu na época em que a gente estava compondo o disco! Boa parte das minhas músicas no disco são sobre esse assunto. Também fiz músicas para o meu avô, como "O véio máximo" do primeiro disco e "Nova_completa" do terceiro. Ele morreu meio que nos meus braços e, incrivelmente, começou a chover bem na hora. Por isso que a musica tem aquele refrão "quase" meloso (risos).

Que nuances há entre o álbum novo e os anteriores?

Andrio: Eu vejo este como um conjunto de altos e baixos, dinâmico, diferente dos outros mais lineares. Tem coisa limpa e cristalina, seguida de uma podreira nunca antes executada por nós nos outros discos. Para mim é a principal diferença.

Lucas: Concordo. Esse disco foi feito pensando em ser um disco, saca? Os outros dois foram a união das músicas que a gente tinha feito até o dia de começar a gravar. Nesse, nós nos permitimos brincar de Pink Floyd e tentar moldar as músicas de acordo com a cara que queríamos dar ao disco. Para isso, foi essencial a pré-produção que fizemos em casa. Acho que nunca mais vamos gravar um disco sem fazer isso antes.

Longe de serem "indies mimados de apartamento", os Guidis têm a cara da "juventude suburbana emergente". É mais legal que ser "cosmopolitano"?

Andrio: Wander Wildner disse, certo dia, que a parte guaibense da banda é o que a salva (risos). Ele se referia justamente a essas marrentices da capital, sobretudo Porto Alegre, tão careta e conservadora.

Lucas: Bom, eu não posso falar nada... Fui criado em Porto Alegre desde guri! (risos). Mas em minha defesa tive uma criação old school com patinete, carrinho de lomba e futebol no meio da rua. O andrio que é o cara do video-game e da bicicleta 18 marchas! (risos).

Músicas como "Mais um dia de cão", "Espiral arco-íris", "Quando se é vidraça" e "Não fosse o bom humor" descrevem o cotidiano de vocês, mas também dizem sobre "condição social" e de como vêem o mundo: uma juventude pragmática e desideologizada...

Andrio: Talvez "Mais um dia de cão" seja a nossa canção mais política, mas não no sentido panfletário. Isso, sim, é uma merda. Já tive banda assim, de botar o dedo na cara e fazer discurso, mas quando tinha 18 anos. A gente sempre procura ser o menos óbvio possível, porém, falando de coisas óbvias, que nos aproximam de quem nos ouve. Desafio hein... Até agora deu certo.

Lucas: Eu só sei fazer música olhando para dentro e não para fora. Juro que já tentei...


Parte da crítica availou que, no segundo álbum, a banda cresceu rápido demais. E no terceiro, quão amadureceram?

Andrio: Eu vejo esse disco soando muito juvenil. Porra, as guitarras tão college rock noventão, em contraste com as letras, ainda existenciais, mas não bobas. Todo mundo faz aniversário e envelhece. E o que está faltando na música nacional são guitarras sujas. Só ouço galera com synth e sopros e sofisticaçõezinhas para encher linguiça.

Lucas: Eu vejo o terceiro meio assim também: tem bastante coisa sofisticada, mas nada metido à besta. A gente ainda é muito criança pra fazer disco "cabeção", contudo, não vamos fazer de novo o primeiro disco.

Muitas bandas independentes promissoras perderam o bonde por falta de discos e hits e ou por ficarem só no esquemão dos shows. Como vocês fazem essa dosagem?

Andrio: Não temos uma fórmula e, se tivéssemos, não entregaríamos esse ouro (risos) .Eu sou o cara que toca como se fosse o último show, é o momento do exorcismo. Música é isso, é descarrego. Nas letras também rola esse tipo de coisa. Vai ver é aí que a gente ganha a torcida: sendo sinceros.

Lucas: Eu acho que a gente tem uma fórmula sim! Ela consiste em não se preocupar esperando a chegada do Papai Noel e tentar fazer a próxima música muito melhor que anterior!

E a opção de permanecer em Porto Alegre?

Andrio: Eu tenho uma vida toda por aqui, casado e trampando numa produtora de jingles muito bacana. Se um dia quisesse me mudar, seria para Buenos Aires. Que cidade do caralho! Efervescência cultural. São Paulo até é legal, pois tem tanta gente que certamente terá um nicho para a tua música, mas sei lá... Ou você entra naquele esquema e dá um tiro no seu pé, ou fica onde está. Nós achamos que o fluxo deste cenário está tão descentralizado que não vemos necessidade de nos mudar, ao menos no momento.

Lucas: É... Eu tenho um assunto inacabado aqui chamado Engenharia Elétrica. Pelo jeito vai continuar inacabado por mais uns anos. E Porto Alegre não é tão longe.

O acústico que virá encartado com o disco saiá em DVD e CD?

Lucas: Sim! Ele entra no terceiro disco como um bônus para o pessoal que ficou esperando 2009 inteiro pra ouvir o disco! (risos) A idéia é lançar em DVD em maio, se tudo correr como planejado.

E a relação "platina" da banda?

Andrio: É uma parceria muito frutifera entre os selos Senhor F e Scatter Records. É uma honra para nós fazer parte deste circuito, que está se expandindo por toda a América Latina. O Festival El Mapa de Todos, realizado pelo Fernando Rosa, em Brasília, confirma isso.

Lucas: O nosso primeiro show em Buenos Aires foi um divisor de águas para mim. Nunca tínhamos tocado para uma platéia que nunca tinha nos ouvido e foi incrível a recepção. O pessoal realmente prestou atenção ao som e aplaudiu com sinceridade. Foi um dos nossos grandes momentos, na minha opinião.

Vocês também estão se aventurando como produtores, produzindo as bandas Prozak e Loomer. Falem sobre a experiência.

Andrio: O Lucas é quem faz as vezes de engenheiro de som: procura captar da melhor forma os instrumentos. Claro que ele também sugere algumas modificações quanto as estruturas das músicas. Mas isso, no caso da Prozak, acho que coube mais a mim, bem como ocupei-me em aprimorar a execução das canções deles. É sempre legal trabalhar com bandas amigas. Os momentos de folga com churrasco e cervejas são os mais recompensadores.

Lucas: Cada centavo que eu ganho hoje em dia é gasto com equipamento para gravação. Descobri que é extremamente divertido. Ô cachaça braba! (risos) Nessas férias eu e o Andrio gravamos a Prozak e eu gravei sozinho a Modernage, aqui de Porto Alegre.

Os Superguidis tocou em dois tributos: Guided By Voices e Mudhoney. Que tal homenagear os ídolos?

Andrio: Muito bacana e divertido. Vem aí também um tributo ao Plato Divorak, que vamos participar. Esse vai ser literalmente mais insano.

Brasília: segunda casa?

Andrio: Até não sei se já não foi promovida a primeira casa...

Lucas: Brasília é que nem a casa da vó!



Superguidis (2010)

1 Roger Waters (Lucas Pocamacha)
2 Não fosse o Bom humor (Andrio Maquenzi)
3 Visão Alem do alcance (Andrio Maquenzi)
4 As camisetas (Lucas Pocamacha)
5 Quando se é vidraça (Andrio Maquenzi)
6 Fã-clube adolescente (Andrio Maquenzi)
7 De mudança (Andrio Maquenzi)
8 Casablanca (Lucas Pocamacha)
9 O usual (Lucas Pocamacha)
10 Nova_completa (Lucas Pocamacha)
11 Aos meus amigos (Andrio Maquenzi)

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