quinta-feira, 25 de setembro de 2008

fESTA pUNK

Era só mais uma blitz. Como qualquer outra. Documentos do automóvel. Carteira de habilitação. Rotina. De dentro do carro Lúcio não notava nada.
Do lado de fora a marofa de maconha circundava os PMs. Desce do carro, magrão! Lúcio, contrariado, desce. Mãos na parede! Lúcio coloca as mãos num muro de tijolos na Loureiro da Silva.
PMs filhos da puta! Porra do caralho, filhos de uma puta! Querem o que? Revistam Lúcio de cima a abaixo. O mais moreno é calmo. O branco é nervoso. Baixa as calças, berra o branco. Lúcio não baixa. Baixa as calças, porra! Lúcio baixa as calças. Nada.
Lúcio, inflamado, esbraveja. Abuso de autoridade, não é? Tão abusando, não é? Achando que eu sou um mané, meu? Quando levanta as calças, uma ponta de béqui cai do bolso interno das calças ao lado do coturno do moreno. O branco bate com o cacetete atrás do joelho de Lúcio. Ele cai de no chão.
Abuso de autoridade é, magrão? Vamos agora pro distrito, seu merdinha. Jogam Lúcio no banco de trás da viatura e se dirigem ao Palácio da Polícia na Ipiranga. E o meu carro? Ainda resmunga Lúcio. Teu carro deixa aí pra recolher. Não é problema nosso. É da prefeitura.
Sozinho numa sala do Palácio, sem os tênis e a cinta das calças, Lúcio se lembra da bolota que guardou na meia. Brigadianos de merda. Nem revistar o cara direito sabem. Olha para os lados só para ter certeza e não vê ninguém por perto. Pega a bolota da meia e engole com plástico e tudo. Talvez saia inteira do outro lado. Já fez isso antes.
Saiu limpinha do outro lado. Passou uma tarde lavando merda até achar a maconha, mas achou. Bem lavadinha, dentro do plástico, estava tão boa quanto antes. Chamou Cássio e Fúlvio naquele dia para fumarem o béqui da merda, como assim chamaram aquele.
Muita merda tinha saído de seu rabo desde então. Aquela seria mais uma. Seria. Ela não sairia. O saquinho plástico arrebentou no estômago. Lúcio começou a ver tudo girando. Pensou que ia desmaiar. Vomitar. Pirar.
Alguém apareceu. Um rato. Devolveu os tênis, a cinta e os documentos. Vai embora daqui, boca aberta. Não queremos nada com chinelão. Apontou um caminho que Lúcio seguiu cambaleando. Sentiu um pé na bunda e a grama da rua na cara. Levantou e saiu flutuando pela Ipiranga. As luzes dos automóveis riscando seus olhos.
Duas horas depois estava sentado no seu carro no mesmo lugar na Loureiro. A rádio ligada tocando uma fita cassete do Elvis Costello. It's the element... lalalá! Chovia.
Ligou o carro e o limpador de pára-brisa. Um papel ensopado se mexia de lá pra cá. Achou que era uma multa. Merda, pensou. Era um flyer. Hoje. Festa punk. Molhou o rosto com a água fria da chuva. Foda-se. Cadelinhas underground, aí vou eu.

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