terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

fERNANDO rOSA: "o rOCK nÃO é mAIS aMERICANO"

[[DESORIENTAÇÃO]] Porque ninguém dá muita bola para esse mercado?
Fernando Rosa – Acho que, em grande parte, é devido ao colonialismo cultural ainda vigente em todos os campos da vida dos países. Buenos Aires, Montevidéu, Santiago e Caracas estão logo ali, mas Londres e Nova York ainda são os atrativos do mercado.
No entanto, penso que assim como quebrou a lógica da grande indústria fonográfica, essa relação de submissão também tende a romper-se. Por outro lado, depois de 50 anos, o rock já não é mais americano, ou inglês − já é uma linguagem universal. Um dos melhores shows do mundo no momento, por exemplo, da banda El Mató a Un Policia Motorizado (foto), pode ser visto em La Plata, no subúrbio de Buenos Aires, e não na Europa.
[[DESORIENTAÇÃO]] – O que explica tantos anos de separação das cenas de rock dos países da América do Sul?
Fernando Rosa – Acho que não existe apenas um motivo, mas vários combinados. Antes de mais nada, acho que é o político. Nas últimas décadas, convivemos com ditaduras pró-Estados Unidos que unificavam apenas os sistemas de perseguição e tortura. Mas também contribuíram para a situação as diferenças econômicas, as distâncias geográficas e a língua. E, claro, uma indústria fonográfica com matriz americana, que determinava o que circulava em nosso país.
Atualmente, uma onda de governos populares, nacionalistas e, mesmo, com viés socialistas mudou o quadro político. Com isso, sopram novos ventos pró-integração em todos os terrenos, seja político, com o Parlamento do Mercosul, por exemplo, econômico, social ou cultural. A internet rompeu com o monopólio das grandes gravadoras e, na brecha dessa crise, crescem nichos de mercado.
Um deles é o independente, que floresce em todos os países, com grande disposição de intercâmbio e troca de informações. Por outro lado, as distâncias ficaram menores com a construção de novas estradas e, especialmente, uma política especial de transporte aéreo, mais eficiente e barato. Ou seja, são novos tempos, que precisamos aproveitar para consolidar um mercado que promova a integração plena do continente.
[[DESORIENTAÇÃO]] – Você acredita que a música é um elo de ligação poderoso para aproximar os países do Mercosul? Ela pode se tornar um instrumento político?
Fernando Rosa – Talvez seja um exagero, mas diria que a música é o principal meio de integração, não apenas em nossa situação específica, mas em toda a história da humanidade. As pessoas, por vezes, sequer sabem onde fica determinado país, não conhecem a língua, a geografia, os costumes, mas por alguma razão, se ligam na música. Vejo que, em geral, os artistas e bandas dos países de língua espanhola mantêm historicamente algum tipo de contato mais estreito.
Soda Stereo, da Argentina, que retornou recentemente aos palcos, lotou estádios em várias capitais dos países da América do Sul, mas no Brasil, não arriscaria um show deles num local para mais de mil pessoas. Então, penso que, além de aprofundar essa relação entre os países de língua espanhola, é preciso aproximar o Brasil desse "outro lado" das nossas enormes fronteiras. Não acho que tenhamos uma postura imperialista, sob qualquer aspecto, mas penso que, devido as dimensões do país, cabe a nós a iniciativa nesse processo.
No Brasil temos uma política de governo voltada para a integração cultural, da qual um exemplo é o o edital da Petrobras de patrocínio aos festivais independentes, que exige participação de artistas do Mercosul. No campo privado, temos o Itaú Cultural que, depois de mapear o Brasil, agora busca desenvolver o mesmo trabalho na América do Sul. A expressão "instrumento político" pode passar uma idéia de manipulação, mas acredito que a música, ao final das contas, é sempre política. Em nosso caso, se apenas aproximar os povos, já estará cumprindo esse papel.
[[DESORIENTAÇÃO]] – Os festivais independentes brasileiros dão boa acolhida às bandas sulamericanas. O mesmo acontece nos outros países, as bandas brasileiras são bem recebidas?
Fernando Rosa – Antes mesmo da existência dessa plataforma de festivais independentes, coordenada pela Abrafin, no caso do Brasil, algumas bandas já promoviam um intercâmbio continental. As bandas uruguaias e argentinas, especialmente, apresentam-se com regularidade nas duas capitais, e também vão à Santiago, no Chile, com freqüência. Só agora o Brasil integrou-se mais efetivamente nesse processo, com bandas brasileiras cruzando as fronteiras, como aconteceu com Autoramas, MQN e Superguidis.
Da mesma forma, a vinda de bandas sulamericanas vem tornando-se uma situação comum, especialmente à convite dos festivais independentes. A recíproca no entanto, ainda é restrita, pois nesses países, em geral, inexiste qualquer tipo de política oficial destinada a bancar esse intercâmbio. Então, cabe aos produtores privados, as próprias bandas e aos selos, mesmo com dificuldades, tomarem a frente do processo. As bandas brasileiras, em geral, são muito bem recebidas. Existe uma curiosidade muito grande pela música brasileira em geral e, claro, pelo rock em especial.
[[DESORIENTAÇÃO]] – Tem previsão para o festival El Mapa de Todos?
Fernando Rosa – A idéia é realizá-lo ainda ainda neste ano, se possível na metade do segundo semestre. A proposta inicial é que aconteça em São Paulo, em algum teatro, em três dias e com um formato flexível. Ou seja, não apenas voltado para o "rock de guitarras", mas também aberto aos songwriters e ao "rock mestizo", digamos assim. O nome Senhor Festival - El Mapa de Todos é para estabelecer o conceito de integração sem fronteiras e mapas. Estamos em fase de preparação do projeto, de definição das bandas e, especialmente, em busca de patrocínios para viabilizar o projeto.
PARA SEGUIR VIAGEM
Fernando Rosa comenta uma lista de dez bandas que fizeram a história do rock sulamericano e destaca cinco músicas simbólicas do cancioneiro rocker-latino. Adelante:

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